Está preso no Complexo Penitenciário da Papuda o delegado aposentado João Kleiber Ésper, da Polícia Civil do Distrito Federal. Condenado em 2010 pelos crimes de prevaricação e ocultação de documento ao omitir depoimento que prejudicaria o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), ele era um foragido procurado até pela Interpol. Acabou detido por ex-colegas de instituição, apoiados por policiais federais, na noite da última segunda-feira, no Aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, ao desembarcar de uma viagem aos Estados Unidos.
Ex-diretor da Divisão de Repressão a Sequestros (DRS), uma das mais importantes unidades da Polícia Civil do DF, Ésper passou a madrugada de ontem na carceragem do Departamento de Polícia Especializado (DPE), ao lado do Parque da Cidade. Pela manhã, foi transferido para a Papuda, onde vai cumprir as penas impostas pela 2ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do DF em dezembro de 2010: seis meses por prevaricação — retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício — e três anos e seis meses por ocultar documento.
As condenações se referem a falhas cometidas no depoimento do advogado Bruno de Miranda Ribeiro, em 2007, contra Renan Calheiros, então presidente do Senado. Bruno acusou o ex-sogro, o empresário Luiz Carlos Garcia, de montar esquema de arrecadação de dinheiro para Renan nos ministérios chefiados pelo PMDB. O depoimento ficou sete meses parado na mesa do delegado João Kleiber, então chefe da 30ª Delegacia de Polícia (São Sebastião). O caso veio à tona em 2007, no auge do escândalo em que o senador foi acusado de receber dinheiro da Mendes Júnior para pagar pensão à filha que teve com a jornalista Mônica Veloso. Acusado de quebra de decoro, Renan escapou da cassação no Senado.
Em dezembro de 2010, a Justiça do DF condenou Ésper em segunda instância. A decisão transitou em julgado — sem direito a recurso — em 5 de março último. No entanto, o delegado não vinha cumprindo a determinação. Com isso, o Núcleo de Investigação e Controle Externo da Atividade Policial (NCAP) do Ministério Público do DF decidiu intervir e pedir a prisão determinada pelo Judiciário. O policial acabou preso por homens da Divisão de Investigação da Corregedoria da Polícia Civil do DF. Ele vai cumprir a pena em regime semiaberto. Ficará preso, mas poderá obter benefícios como sair para trabalhar durante o dia e retornar à cadeia somente para dormir, desde que autorizados pela Vara de Execuções Penais. Ele terá de passar a noite no Centro de Internamento e Reeducação (CIR), para onde são levados policiais condenados.
Ameaças
João Kleiber Ésper também ficou 16 dias detido em março de 2009 por ameaças à ex-corregedora da Polícia Civil do DF Nélia Vieira (Leia quadro). Isso ocorreu logo depois de o policial ser condenado em primeira instância pela Vara Criminal do Paranoá. A situação fez com que a delegada entregasse o cargo de corregedora. No documento de renúncia, ela alegou estresse e necessidade de cuidar de assuntos familiares. Na prática, a decisão foi tomada em consequência da pressão que recebeu por dar andamento a punições de policiais acusados de má conduta.
Ésper ocupou a função de delegado na Polícia Civil do DF por 26 anos. Até setembro de 2007, era diretor da Divisão de Repressão a Sequestros, quando comandou parte das investigações do desaparecimento e assassinato da estudante Isabela Tainara Faria, 14 anos. Após dois meses de apuração, ele acabou afastado do caso. Em meio às investigações contra ele, mesmo após a condenação em segunda instância no processo envolvendo o senador Renan Calheiros, Ésper conseguiu se aposentar por invalidez, em janeiro último.
O governador Agnelo Queiroz o desligou da Polícia Civil três meses depois. Mas, para perder o vínculo com a instituição definitivamente, a aposentadoria de Ésper precisa ser cassada. A medida exige outro ato de Agnelo, o que será recomendado pelo Ministério Público do Distrito Federal. A Divisão de Comunicação da Polícia Civil não informou, até o fechamento desta edição, qual motivou levou Ésper a se aposentar como inválido.
Segundo o Correio apurou, João Kleiber se aposentou por ter alegado "estado de estresse pós-traumático e transtorno depressivo recorrente". A reportagem tentou contato com o advogado do delegado, Rubens Tavares e Sousa, que o representou em recursos no Supremo Tribunal Federal (STF), mas não conseguiu localizá-lo.
Dúvidas
A estudante desapareceu em 14 de maio de 2007, ao voltar do curso de inglês para casa, no Sudoeste. Um mês e meio depois, o corpo dela foi encontrado em um matagal, perto da casa da avó, em Samambaia. A Justiça condenou, em agosto de 2008, um gari a 25 anos e oito meses de prisão pelo sequestro, morte e ocultação de cadáver. A polícia admitiu que outras pessoas devem ter participado do crime, mas alegou não ter como levantar provas, pois a investigação havia sido prejudicada por erros da DRS.
Polêmicas
Desde 2003, o policial civil passou a ser alvo de denúncias
Caso Renan Calheiros
Em 2006, lotado na 30ª DP, em São Sebastião, João Kleiber Ésper tomou depoimento do advogado Bruno Miranda Ribeiro contra o ex-presidente do Senado, Renan Calheiros. Bruno acusava o ex-sogro, o empresário Luiz Carlos Garcia, de montar esquema de arrecadação de dinheiro para o senador nos ministérios do PMDB. O interrogatório ficou sete meses na gaveta do delegado.
Suposta propina
Ésper também é acusado de receber mais de R$ 70 mil de um estelionatário para livrá-lo de um processo, em 2003. Na época, o policial estava lotado na 10ª DP, no Lago Sul. De acordo com as denúncias, ele recebeu o dinheiro de Orlando Rodrigues da Cunha Filho, então presidente da Federação Hípica. Cunha foi preso em julho de 2005, acusado de participar de esquema de falsos empréstimos que lesou 300 pessoas em quatro capitais. Ésper acabou afastado preventivamente da Polícia Civil em abril de 2008.
Prisão
O delegado também ficou 16 dias preso em março de 2009 por denúncias de ameaças à ex-corregedora da polícia NéliaVieira. Estava revoltado porque havia sido condenado a quatro anos e oito meses por conta de crimes cometidos na 30ª DP.
Fonte: Correio Braziliense